segunda-feira, 13 de agosto de 2007

No longínquo ano de 1959...

Pois é. A história sempre se repete. Novas personagens, novos contornos... Vale a pena ler o texto do Ruy Castro, na Folha de hoje. O texto fala por si.


O Brasil acoelhado

RIO DE JANEIRO - Em 1959, o escritor Álvaro Lins, embaixador do Brasil em Portugal, foi atender à campainha de sua casa em Lisboa e deparou com o general Humberto Delgado, líder da oposição portuguesa e inimigo nº 1 do ditador Oliveira Salazar.
Delgado batera à sua porta para pedir asilo político. Dizia-se ameaçado pela Pide, a polícia política. Álvaro Lins não discutiu. Botou-o para dentro. Naquele momento, Delgado era alguém que pedia ajuda ao Brasil -e o Brasil, como signatário dos tratados internacionais que garantiam asilo a perseguidos políticos, não podia deixá-lo na rua.
Em condições normais, seria um processo simples. Lins comunicaria ao chanceler português que Delgado lhe pedira asilo; o chanceler reconheceria esse direito e, dias depois, sempre protegido pela embaixada, Delgado tomaria um avião para o Rio.
Mas não foi o que aconteceu. O chanceler, digo Salazar, negou que houvesse qualquer coisa contra Delgado e pôs a Pide à porta do embaixador, para evitar que o general fugisse. O impasse se arrastou, com Álvaro Lins exibindo os tratados segundo os quais quem decide sobre a situação do asilado é o país que asila. Não adiantava.
E então veio o pior. No Rio, o presidente Juscelino Kubitschek estava tiririca com Álvaro Lins. Aquele caso lhe criava um problema terrível com Salazar, com quem JK não queria ficar mal, para não atrair a antipatia dos ricos negociantes portugueses no Brasil. E dificultou como pôde a vida de Álvaro Lins.
Durou meses, mas Álvaro Lins conseguiu embarcar Delgado naquele avião. Em seguida demitiu-se, fez as malas, deixou suas condecorações para trás e também voltou para o Rio. Onde dedicou-se a combater Juscelino, que, para ele, acoelhara vilmente o Brasil junto a um ditador estrangeiro.

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Um comentário:

Flower Nakamura, ME disse...

A diferença, infelizmente, é que agora não há quem faça frente aos desmandos autoritários dessa caterva que ocupou o poder.